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FILOPARANAVAÍ

domingo, 22 de outubro de 2017

Espero que morrer seja tão bom quanto viver

"Quem ensinasse os homens a morrer, os ensinaria a viver" Do Filósofo M.Montaigne (1533-1592)




DILMA ROUSSEFF, PRIMEIRA MULHER PRESIDENTA


Dilma guerreira do povo brasileiro!

VÍDEO: "EU ODEIO A CLASSE MÉDIA"

Quem ainda não assistiu,assista! A fala é de 2013, mas o conteúdo continua mais atual do que nunca em nosso contexto brasileiro de golpe, de plutocracia (Estado Mínimo), de cleptocracia, de Classe Média coxinha dominada pela mídia a serviço dos golpistas. O cenário político em que Chauí falava era de prosperidade sob os governos Lula-Dilma, para a classe trabalhadora. Hoje, 2017, o cenário é de desolação e retrocessos com perda de direitos, volta da pobreza e miséria. 

"Professora titular do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP), Marilena Chauí informa que existem duas classes no capitalismo [Burguesia e proletariado/classe trabalhadora]. Para ela, a classe média não teria função econômica, mas ideológica. “Como correia de transmissão das ideologias das classes dominantes. Até intelectuais pertencem, hoje, à classe trabalhadora”, dispara. “Técnica e ciência viraram forças produtivas”, analisa. A antiga classe média está apavorada, porque pela escolaridade ela não se distingue, provoca. “Pela profissão, menos ainda, ”atira. Ela está perplexa com a entrada da classe trabalhadora na sociedade de consumo, insiste. “Qualquer um pode andar de avião. Não tem mais distinção nenhuma”, ironiza. Cáustica, a ex-secretária de Cultura da Prefeitura Municipal de São Paulo (1989-1992), sob a gestão de Luiza Erundina, define a classe média como “conservadora e autoritária”. 
LEIA MATÉRIA COMPLETA AQUI.


FILOSOFIA POLÍTICA: Que bom se os corruptos morressem todos de repente!

Que bom se os corruptos morressem todos de repente... Eu diria que outros corruptos renasceriam de seus descendentes. Para mudar a política precisamos estudar, compreender a conjuntura política ditada pelo Sistema Capitalista. A corrupção e o lucro é a alma de um sistema capitalista que aprofunda desigualdades sociais desumanas. O positivo da música de Gabriel é justamente que nos provoca a refletir sobre os rumos da política no Brasil... 



Todo mundo bateu palma quando o corpo caiu
Eu acabava de matar o presidente do Brasil
A criminalidade toma conta da minha mente
Achei que não teria que fazê-lo novamente
Mas tenho pesadelos recorrentes, 
o Temer na minha frente
E eu cantando: Tô feliz, matei o presidente
Fantasmas do passado, 
dos meus tempos de assassino
Quando eu matei o outro, 
eu era apenas um menino

Agora, palestrante, autor de livro infantil
Não fica bem matar o presidente do Brasil
Mas a vontade é grande, tá difícil segurar
Já sei, vamo pra DP, vou me entregar
Chama o delegado, por favor
Sou Gabriel O Pensador
O homem que eles amam odiar
Cantei FDP, Pega Ladrão, Nunca Serão
Agora Chega! 
Até Quando a gente vai ter que apanhar?
Porrada da esquerda e da direita
Derrubaram algumas peças, 
mas a mesa tá difícil de virar
Anota o meu depoimento 
e me prende aqui dentro
Que eu não quero ir pra Brasília 
dar um tiro no Michel
Aí, que maravilha! 
Mata mesmo esse vampiro
Mas um tiro é muito pouco, 
Gabriel 
Mata e canta assim

Hoje eu tô feliz, hoje eu tô feliz
Hoje eu tô feliz, matei o presidente
Hoje eu tô feliz, matei o presidente
Matei o presidente, matei o presidente
Hoje eu tô feliz, hoje eu tô feliz
Hoje eu tô feliz, matei o presidente
Hoje eu tô feliz, matei o presidente

Matei o presidente, matei o presidente
Fiquei até surpreso quando correu a notícia
E a polícia ofereceu apoio pra minha missão
Ninguém vai te prender, policial também é povo
Já matamo presidente, irmão, vai lá e faz de novo
Que é isso?! Eu sou da paz, detesto arma de fogo
Deve ter outro jeito de o Brasil virar o jogo
Que nada, Pensador! 
Vai lá e não deixa ninguém vivo
Se é contra arma de fogo, 
vai no estilo dos nativos
Invade a Câmara e pega os sacanas distraídos
Com veneno na zarabatana, bem no pé do ouvido
Em nome da Amazônia desmatada
Leva um arco e muitas flechas e 
finca uma no coração de cada
Cambada de demônio; 
demorou, manda pro inferno
Já tão todos de terno, e pro enterro vai facilitar
Envia pro capeta com as maletas de dinheiro sujo
De sangue de tantos brasileiros e vamos cantar

Hoje eu tô feliz, hoje eu tô feliz
Hoje eu tô feliz, matei o presidente
Hoje eu tô feliz, matei o presidente
Matei o presidente, matei o presidente
Hoje eu tô feliz, hoje eu tô feliz
Hoje eu tô feliz, matei o presidente
Hoje eu tô feliz, matei o presidente
Matei o presidente, matei o presidente

Áudio e vídeo divulgados, crime escancarado
Mas nem é julgado
Já tinha comprado vários deputados
Fora o foro privilegiado
Então mata o desgraçado
Na comemoração tem a decapitação
Cabeça vira bola e a pelada vai rolar (Chuta!)
Corta a cabeça dele sem perdão
Que essa cabeça rolando vale mais do 
que o Neymar

(É Pensador, é Pensador, é Gabriel O Pensador
É Pensador, é Pensador, é Gabriel O Pensador)

Fácil, um tiro só, bem no olho do safado
E não me arrependo nem um pouco do que eu fiz
Tomei uma providência que me fez muito feliz

Hoje eu tô feliz, hoje eu tô feliz
Hoje eu tô feliz, matei o presidente
Hoje eu tô feliz, matei o presidente
Matei o presidente, matei o presidente
Matei o presidente

(Matei o presidente, matei o presidente, 
matei o presidente)
Eu não matei nem vou matar 
literalmente um presidente
Mas se todos corruptos morressem de repente
Ia ser tudo diferente, ia sobrar tanto dinheiro
Que andaríamos nas ruas 
sem temer o tempo inteiro
Seu pai não ia ser assaltado, 
seu filho não ia virar ladrão
Sua mãe não ia morrer na fila do hospital
E seu primo não ia se matar no Natal
Seu professor não ia lecionar sem esperança
Você não ia querer fazer uma mudança de país?
Sua filha ia poder brincar com outras crianças
E ninguém teria que matar ninguém pra ser feliz
Hoje, estar feliz é uma ilusão
E é o povo desunido que se mata por partido
Sem razão e sem noção
Chamando políticos ridículos de mito
E às vezes nem acredito num futuro mais bonito
Quando o grito é sufocado 
pelo crime organizado instituído
Que censura, tortura e fatura em cima da desgraça
Mas, no fundo, ainda creio no poder da massa
Nossa voz tomando as praças, encurtando 
as diferenças
Recompondo essa bagaça, quero é recompensa
O Pensador é contra violência
Mas aqui a gente peca por excesso de paciência
Com o rouba, mas faz dos verdadeiros marginais
São chamados de Doutor e Vossa Excelência

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

A República de Platão, por Simon Blackburn

Counter
A República de Platão
Artigo para ampliar estudos





A REPÚBLICA DE PLATÃO 
E SEU VALOR INERENTE 
NA HISTÓRIA DA CONSTRUÇÃO 
DO  CONHECIMENTO

Se é que alguns livros mudam o mundo, a República pode bem reivindicar o primeiro lugar. É habitualmente considerada a realização suprema de Platão como filósofo e escritor, brilhantemente suspensa entre os primeiros diálogos zetéticos e inconclusivos e as especulações cosmológicas e dúvidas menos impositivas dos mais tardios. No decurso dos séculos foi provavelmente objeto de mais comentários e sujeito a críticas mais radicais e apaixonadas do que a grande maioria dos outros grandes textos fundadores do mundo moderno. Na realidade, a história das interpretações deste livro constitui, por si mesma, uma disciplina acadêmica, com capítulos de especialistas sobre quase todos os episódios da história da religião e da literatura nos últimos dois mil anos, e até mais. Para mencionar apenas os poetas ingleses mais importantes, há livros integralmente dedicados ao platonismo em Chaucer, Spenser, Shakespeare, Milton, Blake, Shelley e Colleridge, para referir apenas alguns, e muitos outros sobre movimentos e épocas inteiras: Platão e o cristianismo, Platão e o renascimento, Platão e a época vitoriana, Platão e o nazismo, Platão e nós mesmos. A história da influência direta de Platão na filosofia constitui por si mesma outro estudo, apimentado por nomes como Fílon de Alexandria, Macróbio, Porfírio, Pseudo-Dionísio, Eriúgena, tal como os mais conhecidos Plotino, Agostinho e Dante. Por vezes, o Platão de que se trata é o autor de outros textos, nomeadamente do inspirado Banquete ou do teologicamente ambicioso Timeu. Mas a República raramente anda longe.

Quem quer que se demore pelos vastos e silenciosos mausoléus onde se alinham os trabalhos sobre Platão e a sua influência corre o risco de sufocar. Quem quer que escreva sobre este assunto tem de ter consciência de um gigantesco e relutante auditório, composto de estonteantes hordas de espíritos fiscalizando e criticando omissões e simplificações. Muitos destes espíritos pertencem aos mais brilhantes linguistas, acadêmicos, filósofos, teólogos e historiadores das suas respectivas épocas que não vêem com bons olhos o jardim a que dedicaram as suas vidas ser espezinhado por estranhos e infiéis. E a República constitui o santo dos santos, mesmo no centro do santuário, uma vez que durante séculos foi o único tema obrigatório dos estudos filosóficos, e representou na educação desses mesmos acadêmicos a peça central e inspiradora.

Platão escreveu a sua filosofia sob a forma de diálogos, uma forma que requer diferentes vozes e o fluxo e refluxo dos argumentos. Já na antiguidade se notou que o Sócrates, que é o herói desses diálogos, e o próprio Platão são personagens intermutáveis que facilmente admitem múltiplas interpretações: "É bem sabido que Sócrates tinha o hábito de reservar o seu conhecimento ou as suas crenças; um hábito que Platão aprovava", escreveu Santo Agostinho. Uma maneira de interpretar isto é que Platão, e presumivelmente Sócrates, tinham realmente doutrinas a ensinar, mas, por qualquer razão irritante, preferiam revelá-las apenas parcialmente, um pouco de cada vez, numa espécie de striptease intelectual. Esta foi a orientação seguida ocasionalmente por comentadores tontos apaixonados pela ideia de mistérios esotéricos escondidos, acessíveis exclusivamente aos iniciados, entre os quais lhes agrada imaginar-se incluídos.

O modo correto de interpretar a observação de Agostinho é que Platão sentia que a filosofia era mais o objeto de uma atividade do que a absorção de um corpo estático de doutrina. Um processo, não um resultado. Sócrates permanece o grande educador, e aqueles que o procuravam seriam simultaneamente ouvintes e questionadores, participantes no diálogo, e teriam eles próprios de enveredar pelos labirintos do pensamento. A recepção passiva da palavra de nada valeria — este havia sido um dos erros dos adversários de Platão, os sofistas, que cobravam dinheiro por fornecer o produto que vendiam como sabedoria prática (o que nos poderia fazer pensar nas pilhas de saber vazio e literatura comercial que atafulham atualmente as livrarias). 

No final do diálogo Fedro, de Platão, Sócrates profere um discurso contra o ler filosofia como parente pobre do fazê-la. Muitos repetiram esta ideia posteriormente. Schopenhauer descreve a leitura como um mero substituto do pensar por si e prefere citar Goethe, o alemão de saber enciclopédico: "O que herdastes dos vossos antecessores, tendes primeiro de ganhá-lo por vós mesmos a fim de poderdes possuí-lo." Robert Louis Stevenson defendeu que a literatura não é senão a sombra de uma boa conversação. "A conversa é fluida, experimental, continuamente prosseguindo a busca e o progresso; enquanto as palavras escritas permanecem rígidas e tornam-se como que em ídolos até mesmo para o escritor, escamoteando o erro incontornável e fixando os dogmatismos no âmbar da verdade."



A insistência no compromisso, em Platão, vai de par com a sua adoção da forma do diálogo, em que diferentes vozes se fazem ouvir, e são as curvas e contracurvas da argumentação, mais do que uma qualquer conclusão obtida, que nos ajudam a expandir o espírito, à medida que lemos. Nesta perspectiva, a filosofia consiste na descoberta através do diálogo e argumentação ("dialeticamente"); tudo o que lermos mais tarde pode, quando muito, constituir um instrumento para recordar a compreensão obtida neste processo.

Esta concepção dramática do que Platão representa torna mais difícil de criticar. Pode-se rejeitar uma conclusão, mas é muito mais difícil rejeitar um processo de expansão imaginativa e, se levarmos a sério o paralelo com o teatro, pode parecer tão tolo como "rejeitar" o King Lear ou o Hamlet. Na realidade, o paralelismo não impede a crítica, mas encoraja-a. No decurso dos dramas platônicos, as teses são afirmadas e defendidas, os argumentos apresentados e as pessoas persuadidas. Por vezes, o drama culmina numa aparente conclusão. E em todos estes casos é apropriado perguntar-se se as teses, os argumentos e conclusões são de fato aceitáveis. Fazê-lo não é nem mais nem menos do que participar no drama e entrar na arena dialética, a atividade que Sócrates e Platão nos recomendam.

Mas Platão e a República têm os seus detratores. No quadro de Rafael A Escola de Atenas, Platão e Aristóteles ocupam ambos o centro da cena, mas enquanto Aristóteles aponta para a Terra, Platão aponta para cima, para os Céus.



Coleridge estabeleceu o mesmo contraste, dizendo que todos nascem ou platônicos ou aristotélicos, querendo significar que Platão é um místico, que se movimenta na abstração, enquanto Aristóteles é o homem empírico e prosaico que encara as coisas como se apresentam no mundo tal qual o vemos. E Coleridge prosseguiu: "Não creio ser possível que alguém que nasceu aristotélico venha a tornar-se um platônico e tenho a certeza que ninguém que nasceu platônico pode alguma vez tornar-se um aristotélico."

Muito da República pode ser lido como relativamente incontroverso, independentemente da nossa posição quanto ao conteúdo metafísico dos capítulos centrais da obra, em especial o excerto que todos recordam, o Mito da Caverna. Na melhor das interpretações, está muito longe de sugerir uma imagem visionária e romântica, fruto de êxtases e iluminações divinas. De fato, podemos dar-lhe um sentido menos enfático, e vê-lo como um apelo razoável a uma compreensão do mundo real do mesmo gênero da que, dois milênios depois, é oferecida pela ciência e pela matemática. Pode ser que Platão tenha sido terrivelmente atraiçoado pelos platônicos — um destino frequente dos grandes filósofos.

Mas há outras razões, menos doutrinais, que deviam levar-nos a considerar surpreendente a soberania da República. A obra arrasta-se infindavelmente de forma labiríntica. Longe de serem convincentes, os argumentos vão desde os menos sólidos até aos tão absurdamente frágeis que levam alguns intérpretes a negar que alguma vez tenha havido a intenção de os apresentar como argumentos. A teoria sobre a natureza humana, tal como se apresenta, é fantasiosa e pode parecer inconsistente. As suas supostas implicações políticas são fundamentalmente desagradáveis e muitas vezes chocantes. Tanto quanto Platão nos deixou um legado no domínio da política, incluem-se nele a teocracia ou governo de sacerdotes, o militarismo, o nacionalismo, a hierarquia, o conservadorismo, o totalitarismo e o completo desprezo pelas estruturas econômicas da sociedade, nascido da sua condição privilegiada de esclavagista. Na República, Platão consegue ligar-se simultaneamente ao mais rígido dos conservadorismos e à mais extrema e visionária das utopias. Ainda por cima, a teoria do conhecimento da obra é um verdadeiro desastre. A tentativa de chegar ao que aparentemente pretendia — mostrar que o indivíduo moral, e só ele, é feliz — é, em grande medida, uma sequência de passes de magia.

Mais insidiosamente, na medida em que se pode falar de um estilo estético ligado a Platão, não é algo que nos possa facilmente fascinar, a menos que estejamos demasiado impregnados dele para podermos escapar-lhe. A quinta-essência do platonismo, pelo menos em Inglaterra, encontramo-la na luminescência dourada da época vitoriana tardia e da época eduardina — o vagamente homoerótico, vagamente religioso, emocionalmente paralisado, ocioso e classista mundo dos campos de jogos, colégios caros e universidades preguiçosas, o mundo de Walter Pater ou de E. M. Forster, de literatos e estetas meio esquecidos como John Addington Symonds ou Goldsworthy Lowes Dickinson, ou meninos bonitos poetas como Rupert Brooke. Esse não é o nosso mundo. Também não é propriamente um mundo de esclavagistas, mas o capitalismo regurgita os seus próprios parasitas.

Outro aspecto igualmente chocante, aos olhos de alguns, é que, ao escrever a República, Platão atraiçoou completamente o seu mestre Sócrates. Sócrates é o primeiro e o maior dos heróis liberais, mártir da liberdade de pensamento e expressão. Para autores como John Stuart Mill e George Grote — pensadores pragmáticos, liberais e utilitaristas — esse é o verdadeiro Sócrates, o eterno espírito de reflexão, crítica e, potencialmente, de oposição ao próprio estado. Mas na República ele é apresentado como um perfeito dogmático, em completo contraste com a abertura de espírito, a paciência e o espírito inquisitivo que os seus admiradores apreciam. Aparece como porta-voz de uma sociedade repressiva, autoritária, estática e hierárquica na qual tudo até mesmo as relações sexuais e o planeamento familiar é regulamentado pelas classes políticas que, deliberadamente, usam a mentira para esse fim. No sistema social que nos apresenta, o Sócrates liberal teria sido executado muito mais expeditamente do que pela democracia ateniense. Na República, o Sócrates liberal é o porta-voz da ditadura. Ao apresentá-lo desta forma, Platão atraiçoa-se a si mesmo: ele próprio, em tempos poeta, exige agora o exílio dos poetas.



Uma obra pode ter muitos defeitos e serem-lhe perdoados se o autor se revela um exemplo de doçura e luminosidade, como acontece com a personagem literariamente criada por Platão, o Sócrates dos primeiros diálogos. Mas no caso isso não nos ajuda muito. É verdade que, no início, deve ter havido em Platão a doçura e a luz necessárias à criação do Sócrates heroico e liberal. Mas se essa figura se esfuma, como acontece na República, não há muito mais que possamos colocar no prato da balança. Sabemos muito pouco sobre Platão e o que há para saber não é, de um modo geral, atraente. Integrado no seu contexto histórico, podemos encontrar um velho azedo típico, um aristocrata desiludido, odiando a democracia ateniense, convencido de que governam as pessoas erradas, com um medo profundo da própria democracia, constantemente escarnecendo dos artesãos, agricultores e, afinal, de qualquer trabalho produtivo, desprezando radicalmente todo o anseio dos trabalhadores pela educação, e, em última análise, manifestando um apego indefectível ao regime intolerável de Esparta.

Mas, como tantas vezes em Platão, há algo que confunde essa imagem, simpaticamente revelado pela reação de Nietzsche ao fato de Platão, no seu leito de morte, ter lido Aristófanes, o autor cômico: "nada me fez meditar tanto na natureza secreta e esfíngica de Platão do que o felizmente conservado episódio de que, debaixo da almofada do seu leito de morte não havia uma bíblia, nem nada de egípcio, pitagórico ou platônico — mas um livro de Aristófanes. Como poderia Platão ter suportado a existência — uma existência grega que ele repudiou — sem Aristófanes?"

Dizem-nos que Jesus chorou, mas não que tenha rido. Com Platão, tal como com Sócrates, o riso está frequentemente mais perto do que se imagina. E isto é um bom sinal. Talvez o velho azedo não fosse, afinal, tão azedo. Mas isto não tem realmente importância, porque é a obra concreta que perdura que nos diz respeito, e não a sombra do seu autor que partiu há muito. E, aquilo que se costuma dizer, que apesar de muitos livros serem erradamente esquecidos, nenhum é erradamente lembrado, é uma verdade inquestionável. Assim, precisamos de trabalhar arduamente para nos reconciliarmos com o poder da República que, incontestavelmente, perdura. Precisamos de compreender a atração que este livro exerceu e continua a exercer sobre a imaginação dos leitores.

Simon Blackburn
Tradução de Luís Gottschalk
Texto retirado de A República de Platão: Uma Biografia (Jorge Zahar, 2008).
Fonte: criticanarede

FILOSOFIA POLÍTICA: Noção de cidadania na antiguidade clássica: Gregos.



Professor PDE*: Edimar Eugenio 
Tema: O ENSINO DE FILOSOFIA E A CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA. 

Título: 
O ensino e a construção da cidadania: concepções e métodos na perspectiva gramsciana. 

Texto 1  


Noção de cidadania 
na antiguidade clássica: Gregos

Comumente o conceito cidadania remonta ao mundo grego e é para lá que faremos nossa primeira parada. Antes das formas mais organizadas de sociedade havia entre os gregos a organização familiar numerosa onde cada uma tinha suas divindades e deuses domésticos. Esse tipo de religião doméstica mantinha isolado as demais famílias que aos poucos, em razão dos casamentos, elas se uniam em torno de um deus comum e superior ao doméstico. 

As "fratrias" ou "curias" surgiram posteriormente embora mantendo-se os laços de sangue. Por meio do pai, a fratria amplia-se formando pequenas sociedades com seus deuses e cultos, sacerdócios, justiça e governo. Com o tempo elas unem-se em tribos com seus símbolos e altares e divindades protetoras, organizando-se me assembleias, promulgando decretos em que os membros se submetem e instituindo tribunais com direito a jurisdição sobre todos os seus membros. O culto religioso passa a ter importância fundamental à medida que se torna um vínculo entre as tribos, momento de se cultivarem uma religião comum. Dessa prática nascem as cidades. Assim, de acordo com Libânio (1995, p.17). 

O conceito de cidadania paga, logo no seu início, inegável tributo religioso. As cidades originam-se, portanto, do movimento de pequenas células que se unem: famílias em fratrias, fratrias em tribos, tribos em cidades. Cada novo momento não anula a individualidade nem a independência da célula anterior em seus cultos, sacerdócios, direitos de propriedade, justiça interna, reuniões, festas, chefes, etc. 

Inserido nessa dinâmica quádrupla, o jovem grego só alcançaria sua real pertença aos dezesseis ou dezoito anos ao passar pelos rituais de passagem quando ao proferir os juramentos de obrigações e respeito à religião da cidade, este passa a ser aceito como verdadeiro cidadão e passa a exercer sua cidadania efetiva. Desta maneira, a criação e origem da cidadania já em tempos remotos implicariam num vínculo social que envolve regras aceitas por todos, sob determinada autoridade ou poder, e conseqüentemente o irrestrito respeito e obediência a eles. Além do mais, as paixões e os interesses individuais devem estar submetidos à razão e ao que é público, e estes, ao interesse da coletividade. O que parece não diferir do conceito moderno ao menos em formalmente. 

Ao que parece aqui, a cidadania não se trata de uma conquista e sim de um processo de iniciação, de introdução a uma nova realidade dominada pela ideologia religiosa e do absoluto. Portanto, embora pareça uma evolução no sentido de organização complexa ela ainda está aquém do ideal de liberdade que conhecemos hoje e que seriam conquistados apenas no século XVII e XVIII de nossa era.

O que se pode afirma é que a organização do mundo greco-romano em cidades-estado representou uma revolução em termos de organização social do mundo antigo. Pois a partir delas essas sociedades puderam dar um salto qualitativo no sentido da autonomia, técnicas e avanços culturais. Basta ver que para se construir moradias, sistemas de abastecimento e prédios públicos necessita-se, além da muita criatividade, do conhecimento científico. 

Devemos compreender a cidadania grega e posteriormente a greco-romana a partir da invenção das cidades-estado. Como descrita acima, a aquisição da cidadania grega passava por uma iniciação ritualística e não uma conquista. As cidades-estado longe de se parecer com o conceito de cidade hoje em dia, era mais um território agrícola que funcionava por meio da exploração agrícola. Além do mais, esses territórios compreendiam uma diversidade de culturas e costumes diferentes entre seus integrantes. Eram geograficamente localizadas e circunscritas e não existiam em todo o ocidente durante os séculos IX e VII a. C. . Assim nem todos possuíam na prática as regalias públicas de um cidadão e nem sempre estavam incluídos nessa categoria, como referencia Guarinello in Pinsk, J. (2005, p. 32).

De modo geral, podemos dizer que as cidades-estado formavam associações de proprietários privados de terra. Só tinha acesso a terra, no entanto, quem fosse membro da comunidade. As cidades-estado foram o resultado do fechamento, gradual e ao longo de vários séculos, de territórios agrícolas específicos, cujos habitantes se estruturavam, progressivamente, como comunidades, excluindo os estrangeiros e defendendo coletivamente suas planícies cultivadas da agressão externa. 

Tendo acesso a terra apenas membros da comunidade, fecha-se a possibilidade ao estrangeiro. Ainda mais quando a consangüinidade dita à norma e a cidadania era transmitida idealmente por esses laços de geração em geração, portanto, de longe se vislumbra a idéia de universalidade nesse período. 

Dessa forma, como resolver os problemas acerca da vivência cidadã da comunidade? A solução viria mais tarde com as assembleias públicas dos próprios proprietários de terras, através do Conselho dos anciãos (Senado romano e Gerúsia espartana) ou a assembléia dos cidadãos (como a boulé ateniense). Assembleias políticas posteriormente com atribuições de magistratura e tribunais. 

 Os laços consanguíneos e os registros que em bem vigiados garantiam a pertença do indivíduo à cidade, o que não ocorria fora dela, pois, fora da cidade não havia nem liberdade e nem direito a propriedade. Assim, como afirma Aristóteles, fora da cidade não havia indivíduo plenos e livres, com direitos e garantias sobre a pessoa e seus bens.


Referências: 

1) ARROYO, M.; BUFFA, E.; NOSELLA, P. Educação e cidadania: quem educa o cidadão. São Paulo, SP: Autores associados, 1991.

 2) BUFFA, E. BRASIL – EDUCAÇÃO E CIDADANIA: PARA ALÉM DAS BURGUESIAS. Agência de Informação Frei Tito para a América Latina - ADITAL, 2007 [citado 2013 Jun. 13] Disponível em: http://www.adital.com.br/site/noticia2.asp?lang=PT&cod=28860 Acesso em 13 de junho de 2013.

 3) DEMO, P. Cidadania menor: algumas indicações quantitativas de nossa pobreza política. Petrópolis, RJ: Vozes, 1992.

 4) GRAMSCI, A. Cadernos do Cárcere. Concepção dialética da história. Título original do italiano: Il materialismo storico e La filosofia de Benedetto Croce. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. 8ª edição. Rio de Janeiro-RJ: Civilização Brasileira, 1989.

 5) HORN, G. B. Ensinar Filosofia – pressupostos teóricos e metodológicos. Coleção filosofia e ensino, 13. Ijuí, RS: Editora Unijuí, 2009


Mapas Grécia Antiga
Geralmente chama-se "Grécia Antiga" a todo o período 
da história grega anterior ao Império Romano






Filoparanavaí 2017

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

De cada dez novos empregos no Brasil, sete são informais. Quem são esses trabalhadores?


A TV Afiada mostra um pouco do dia a dia dos ambulantes nas avenidas de São Paulo. Todos os dias, gente como Washington, Rita e José Francisco se arrisca entre os carros e motos para vender água, doces e outros produtos.



LEIA MAIS SOBRE POBREZA E DESEMPREGO NO GOVERNO TEMER PÓS-GOLPE 2016:

TEMER JOGA MAIS 2,75 MILHÕES DE BRASILEIROS NA EXTREMA POBREZA

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

O BRASIL DEVERIA APRENDER COM A DEMOCRACIA VENEZUELANA

Mas que contradição... 
O país que nossa mídia brasileira acusa dia e noite de ditadura, tem eleições constantes num verdadeiro ato de democracia que lá vai mais longe do que simplesmente votar. Na Venezuela há uma politização crescente da população beneficiada pelo chavismo e que não deseja ver a burguesia podre de sempre voltar ao poder e acabar com a vida boa do povo, como aconteceu no Brasil.


O chavismo obteve  54% do voto nacional, frente a 45% da oposição, destacou o presidente Nicolás Maduro. A Revolução Bolivariana ganhou 17 de 22 governos estaduais do país nos comitês regionais de informática do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), Tibisay Lucena. Só o estado de Bolívar não tem uma tendência irreversível. Com a tendência irreversível de 22 estados, a Revolução Bolivariana ganhou 17 governações e a oposição cinco. A participação eleitoral foi de 61,14%, detalhada na diretora do CNE. Uma cifra superior al 53.94% de 2012. (FONTE: https://pcb.org.br/)




sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Este vídeo não é um programa político...

Este vídeo não é um programa político... Do Partido dos Trabalhadores... É pura história do Brasil atual, é história viva envolvendo  sonhos realizados de milhões de brasileiros e brasileiras e agora, o pesadelo no qual nos jogaram os golpistas, elite egoísta, e corruptos. O golpe está acabando com nosso país! Temos que reagir. Não podemos nos calar enquanto nossos algozes avançam nos jogando em um precipício sem fim. O governo dos ricos não pode continuar, é hora dos pobres levantarem sua voz. Não podemos permitir a caçada empreendida por um juiz que julga sem provas e reconhece isto nos autos. Vale a pena assistir este vídeo para renovarmos nossas esperanças....

Outro vídeo que vale a pena assistir...

terça-feira, 10 de outubro de 2017

ARTE: 100% INTOLERANTES COM A INTOLERÂNCIA!

O Brasil quer se ver livre da Intolerância. As vozes que se levantam contra a censura e a difamação, são as que acreditam no respeito, na diversidade e no amor. Não aceitaremos que um falso moralismo, oportunista e eleitoreiro, contamine a sociedade para fortalecer os interesses políticos dos fundamentalistas. A defesa da arte é a defesa de uma sociedade consciente e que luta por justiça. Não nos intimidaremos com os ataques orquestrados dos extremistas e dos robôs de internet. Somos muitos e juntos somos mais fortes.



Masp expõe mais de 200 obras sobre a história da sexualidade Mostra será inaugurada em 19/10 e reúne trabalhos de artistas como Anita Malfatti, Francis Bacon, Edgar Degas e Pablo Picasso - e tem classificação livre

Obra de Dorothy Iannone, de 1969-70 (Cortesia Peres Projects/Divulgação)

A mostra vai ocupar três espaços expositivos do Masp: a sala de vídeo (que contará com um trabalho inédito de Mauricio Dias & Walter Riedweg), a galeria do primeiro subsolo e o primeiro andar. É lá que estará a maior parte das obras, divididas em oito núcleos temáticos, sendo eles Corpos Nus, Totemismos, Religiosidade, Performatividade de Gênero, Jogos Sexuais, Mercado de Sexo, Linguagens e Voyeurismo. 

Segundo o Masp, que completa 70 anos em outubro, estarão expostos corpos femininos, masculinos, trans e travestis de diferentes belezas e padrões, que podem “suscitar reações de repulsa e abjeção, desejo e encantamento”. Uma vitrine também vai abrigar imagens de diversas representações de órgãos sexuais, com falos, vulvas e seios. 
LEIA A MATÉRIA COMPLETA AQUI

domingo, 8 de outubro de 2017

Bolsonaro, um sujeito necessário para a humanidade



Na sua opinião 
quem vale mais? 

A Revista Veja 
ou o Bolsonaro? 



A Revista Veja tem um histórico de publicar mentiras distorcendo fatos da realidade, tem um histórico de perseguições como a que Bolsonaro experimenta agora. Sim, ele agora é alvo da Revista. Se bem que para desconstruir Bolsonaro não é necessário inventar mentiras. Vai ser fácil para a revista demonstrar quem é Bolsonaro. Mas , o mais risível é que o próprio Bolsonaro sempre utilizou-se de publicações desta revista, em suas páginas sociais, para dar credibilidade aos seus discursos de ódio contra o PT - Partido dos Trabalhadores, contra Dilma Rousseff ou contra o principal alvo da Revista golpista: LULA. 

A Revista cumpre o seu papel. Sendo uma das mídias concentradas em mãos de meia dúzia de indivíduos do capital rentista brasileiro, a revista não passa de uma cartilha semanal a serviço da disseminação da ideologia burguesa local. O objetivo da revista é manipular, é formar uma opinião entre os seus replicadores na sociedade: a classe média, da qual parte é fiel leitora dos besteróis publicados pela Revista. 

Mas, Bolsonaro é diferente da Revista? Eu responderia que não se considerarmos que Bolsonaro não passa de um fantoche nas mãos da elite. 

Bolsonaro também não passa de um instrumento útil da elite burguesa local como é a Revista Veja. Ele replica o discurso ideológico da direita brasileira. Vota sempre ao lado da burguesia, defende os interesses da burguesia como se fossem universais e se coloca contra tudo aquilo que não possa ser identificado com essa ideologia. Daí que os pobres, negros, homossexuais, indígenas, mulheres e outros, são alvo constante de seus discursos carregados de ódio. 

Jair Bolsonaro não apenas é réu em vários processos como já está condenado em alguns, inclusive no STJ ( Leia STJ confirma condenação de Bolsonaro por danos morais a Maria do Rosário) - (Leia Bolsonaro é condenado por comentário racista contra quilombolas. Leia a íntegra).

PARA COMPREENDER O PROCESSO QUE BOLSONARO RESPONDE E JÁ CONDENADO - PALESTRA no Clube Hebraica, em Laranjeiras, Zona Sul do Rio - 03/06/2017:  Na ação, os procuradores da República sustentam que Bolsonaro distorceu informações e fez uso de “expressões injuriosas, preconceituosas e discriminatórias com o claro propósito de ofender, ridicularizar, maltratar e desumanizar as comunidades quilombolas e a população negra”. No Hebraica, segundo MPF, o deputado afirmou, por exemplo, que visitou uma comunidade quilombola e “o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas”. Ainda citando a visita, disse também: “não fazem nada, eu acho que nem pra procriar servem mais”. Para os procuradores da República Ana Padilha e Renato Machado, as afirmações “desumanizam as pessoas negras, retirando-lhes a honra e a dignidade ao associá-las à condição de animal”. “Com base nas humilhantes ofensas, é evidente que não podemos entender que o réu está acobertado pela liberdade de expressão, quando claramente ultrapassa qualquer limite constitucional, ofendendo a honra, a imagem e a dignidade das pessoas citadas, com base em atitudes inquestionavelmente preconceituosas e discriminatórias, consubstanciadas nas afirmações proferidas pelo réu na ocasião em comento”, concluem os procuradores na ação. Na sentença,  a juíza Frana Elizabeth Mendes, da 26ª Vara Federal do Rio de Janeiro, afirma que está “evidenciada a total inadequação da postura e conduta praticada pelo réu, infelizmente, usual, a qual ataca toda a coletividade e não só o grupo dos quilombolas e população negra em geral”. 

LEIA MAIS PARA COMPREENDER:
 
Uma coisa é Bolsonaro responder a vários processos e ser condenado. Outra bem diferente, são seus seguidores replicarem a ignorância carregada de ódio de seu líder. Bolsonaro fez uma fortuna em sua carreira política, o que pode lhe dar a possibilidade de contratar advogados e protelar processos na justiça. Ele tem uma coisa chamada "dinheiro". E ainda se esconde atrás de um direito parlamentar chamado de "imunidade".

Então como entender a matéria anti-Bolsonaro deste fim de semana? Simples. Bolsonaro pode ser a última opção da elite, mas jamais a primeira. Bolsonaro, apesar de ser útil já não é mais quando pensa em ser candidato à presidência e ocupa a dianteira nas pesquisas dentre os representantes da direita. Ele pode ter sido útil, mas Bolsonaro, todos sabem, seria um desastre para a classe trabalhadora que veria em seu governo o massacre total dos direitos que ainda sobreviverem ao governo golpista atual de Temer. Mas para a elite ele não serve porque não passa de um "incompetente" cercado de políticos semelhantes. O capital rentista precisa de garantias e um sujeito movido pelo ódio poderia colocar tudo a perder.

O título deste artigo de opinião pode até nos causar uma certa celeuma, porém o objetivo é fazer uma breve reflexão sobre a importância negativa de Bolsonaro para a humanidade.


Jair M. Bolsonaro está em seu sexto mandato como parlamentar e troca de partido como troca de gravata. Isto por si só já demonstra um homem pouco dado ao equilíbrio, pouco fiel a ideais coletivos. Tanto tempo como parlamentar e quase uma dezena de partidos denunciam um homem pouco ocupado das necessidades do povo trabalhador brasileiro e pouco interessado em firmar comunhão ideológica também voltada aos interesses do povo. 


Bolsonaro não se destaca por compromissos com os trabalhadores, maioria da população brasileira. Suas posições no Congresso são conservadoras e sempre acompanha no voto os interesses da elite. Ele apenas se destaca por colocar-se de maneira mais visível durante o processo de destituição da presidenta  eleita Dilma Rousseff durante um processo controverso e denominado de golpe parlamentar. Foi neste período que o político Bolsonaro ganhou espaços na mídia controlada por meia dúzia de famílias e que está a serviço do grande capital.


Então, por que Bolsonaro é necessário à humanidade? Eu penso que a resposta mais plausível é a de que Bolsonaro é uma referência daquilo que nenhum homem ou mulher deva seguir como exemplo de humanidade. Bolsonaro é político de um discurso vazio de humanidade e carregado de ódio, carregado de ignorância contra forças sociais que lutam pelos interesses dos trabalhadores, contra os direitos humanos, contra as minorias e maiorias discriminadas. O político para aparecer e ganhar aplausos de seguidores tão deprimentes como o líder, ataca mulheres, sujeitos homoafetivos, negros e outros de forma impiedosa e com discursos carregados de grande ignorância.

Esconder-se na ignorância não dá trabalho. Não é necessário estudar. E parece que estudar definitivamente não é o forte de Bolsonaro. Ele prefere falar frases de efeito imediato. Gosta de fazer discursos que seus seguidores desejam. Basta ouvir Bolsonaro por 10 minutos para perceber que ignorância é o seu forte. Ele é capaz, por exemplo, de falar sobre violência social como se fosse uma coisa tão simples que tira aplausos de seus seguidores que sabem menos, muito menos do que seu líder. Isto é fato!

Resumindo: Bolsonaro é útil para a elite burguesa no sentido de ser um fantoche que pode ser manipulado para satisfazer interesses da elite financeira e rentista por meio de uma ideologia de direita; e é importante para a humanidade porque se alguém quer saber o que fazer para se homem ou mulher melhores, mais humano... Olhe para o bolsonaro e não siga nenhum de seus exemplos. 

No vídeo abaixo, Leonardo Stoppa do Brasil247, faz uma boa análise da conjuntura política atual.


 VALE A PENA ASSISTIR O DISCURSO DE BENEDITA DA SILVA, SENADORA! 

MENOS ÓDIO...
Para finalizar:

Resposta do potencial candidato à presidência do Brasil, Jair Bolsonaro. SUA PROPOSTA PARA RESOLVER O PROBLEMA DE SEGURANÇA  NO PAÍS CASO SEJA ELEITO: "todo mundo terá uma arma de fogo em casa". Imagine agora cada brasileiro com uma arma de fogo. Problema de segurança solucionado? Não precisa ser muito inteligente para flagrar que trata-se de mais um pensamento, se é que podemos chamar a isto de prensamento, de um sujeito boçal ( aliás, boçal significa rude, ignorante, babaca, idiota, pessoa que se acha melhor do que os outros). Boçal é um termo muito feliz para classificarmos os comportamentos públicos e discursos do deputado eleito pelo Rio de Janeiro. Thomas Hobbes, filósofo inglês, autor do Leviatã, afirmava que é impossível o homem viver em estado de natureza que seria todos contra todos (o homem é lobo do homem) e prevaleceria a lei do mais forte. Então foi criado um pacto aonde nasce o Estado para proteger os mais fracos. Vamos supor que cada brasileiro pudesse ter uma arma de fogo. Em um país marcado por profundas desigualdades sociais, independente da regulação que fizerem - pois não importa o poder de fogo da arma, todas potencialmente matam - teríamos um poder de porte fatalmente desigual e, mais que isso, um aumento da violência. Eu penso que, a violência em geral - homicídios são apenas uma das pontas do iceberg - e obviamente que não resolvemos o problema da violência nem liberando geral o porte e nem restringindo totalmente o porte. A questão é complexa. A violência no Brasil é estrutural e está ligada diretamente à desigualdade social profunda na qual encontra-se nossa população. Segurança se resolve com políticas públicas voltadas para os mais pobres e com ações enérgicas de um governo que possa começar por taxar grandes fortunas, democratizar a comunicação no país, diminuir juros e aumentar empregos e, sobretudo, fazer uma profunda e ampla reforma agrária, além de impulsionar a educação superior brasileira, com qualidade e com acesso universal. Uma discussão que não passe por estes problemas jamais irá ser suficiente para pensar o problema da violência. É por isso que fiquei surpreendido com a palestra de uma pessoa como Bolsonaro, no dia 03/06/2017, em um espaço como o da Hebraica. Mais surpreendente ainda era ver a deprimente plateia rindo e aplaudindo aquele que encarna em ideias o próprio algoz dos judeus, em um tempo não muito distante e em uma região geográfica chamada de domínio alemão.

PARA NÃO FINALIZAR... O problema central de Bolsonaro (para além de sua ignorância, falta de respeito à diversidade, discursos carregados de preconceitos e ódio, atos discriminatórios) reside no fato de que como político nunca esteve do lado dos interesses do povo, daquela maioria da pirâmide social que tanto precisa do Estado. Bolsonaro sempre esteve do lado do capital, do lado dos algozes do povo: Bolsonaro tenta emplacar que é candidato “outsider” fora do sistema político, que se retroalimentou do vazio político e do ódio que moveram contra Lula e o Partido dos Trabalhadores que foi capitalizado por Bolsonaro e não pelo PSDB, PMDB como inicialmente pensavam. Veja como votou Bolsonaro a favor de projetos impopulares de Temer, que tiram direitos,salários, cortam orçamento da saúde e educação, mostrando que só o discurso de Bolsonaro é que é diferente de sua prática. LEIA MAIS EM: 


COMO FUNCIONA A RELAÇÃO BOLSONARO X VEJA: Após chamar Bolsonaro, entre outras coisas, de “ameaça”, Veja faz evento com ele por R$ 900 o ingresso. 

“Engraçada” não é bem a palavra, mas para um domingo de manhã está de bom tamanho. A magra edição desta semana, que já está caduca, chama Jair Bolsonaro de “talvez a maior ameaça que o Brasil já enfrentou no atual ciclo democrático”. 

Ele é um candidato “insular”. Atrás de Lula nas pesquisas, “suas ideias extremistas, seu discurso agressivo e seu isolamento são um sinal de alerta”.

O jornalista e sociólogo Demétrio Magnoli dá-lhe uma cacetada grave. “Não ter uma base ampla e organizada não é novidade em uma eleição. Outros candidatos menos asquerosos disputarão as eleições de 2018 também sem amplas bases”, diz. 

“Isso tudo coloca um problema: como conseguirão maioria parlamentar que dê sustentação às decisões? No campo da especulação, um presidente isolado com o perfil de Bolsonaro pode tentar apelar diretamente ao povo, por cima das instituições democráticas.” Um projeto de ditador.

A revista trata Bolsonaro como se não tivesse responsabilidade alguma sobre uma criatura oriunda da cultura do ódio e do jornalismo seletivo e mono obsessivo que pratica. O mais divertido, porém, não é isso. É que a Veja está faturando numa “parceria” com Jair. No dia 27 de novembro, a “ameaça à democracia”, o “extremista”, o “asqueroso” estará num evento das Páginas Amarelas. O preço do ingresso é 900 reais. 

O entrevistador será Augusto Nunes, colunista de extrema direita que divide seu tempo xingando os de sempre na publicação e fazendo a mesma coisa na Jovem Pan. Outros convidados são o arroz de festa Sérgio Moro (aceita batizados), João Doria, Barroso, Alckmin e Henrique Meirelles. Os seguidores fanáticos de Bolsonaro, que confirmou presença, vão pagar para ver. Nem que tivessem que vender a mãe. Depois vão filmar o colóquio e fazer mais propaganda. 

Na draga, inadimplente, a Editora Abril apela para o troco dos fãs do fascista que acusou. No ano que vem, mais algumas matérias fingindo supresa com o “mito” — isto é, se a Veja ainda existir. É assim que se serve alfafa para os leitores e para o Brasil. Não é a toa que a Editora Abril está indo para o buraco aceleradamente. Em 2018, Bolsonaro estará mais vivo do que a Veja. Uma ameaça a menos à democracia. LEIA O ARTIGO NA ÍNTEGRA AQUI

ARTIGO

OS CONTEÚDOS TRANSVERSAIS: PROBLEMATIZAÇÃO A PARTIR DA CISÃO ENTRE EDUCAÇÃO E CULTURA
Autoria: Me. Lucio Lopes (L.L.L.)




RESUMO

Minha experiência como docente na educação básica me possibilita afirmar que os conteúdos “transversais”, que aqui no Estado do Paraná chamamos de problemas ou desafios contemporâneos, ainda que estejam nas propostas pedagógicas como obrigatórios para todas as disciplinas, encontra um certo desprezo que se perpetua na prática pedagógica por meio de uma cisão entre aquilo que chamamos de Cultura Acadêmica e aquilo que entendemos por Cultura Popular. Ora, não é esta cisão uma grande contradição? Eu diria que sim desde a compreensão de que a educação institucional tem por objetivo final justamente possibilitar aos educandos uma capacidade crítica capaz de mobilizar saberes que perpassam obrigatoriamente estas culturas a fim de observar e ler, de levantar problemas, reelaborar problemas, desenvolver respostas inovadoras para os mesmos e desenvolver a capacidade para intervir na realidade a fim de recriá-la. É desta percepção subjetiva que nasce a proposta deste artigo que pretende refletir de maneira dedutiva as “deficiências” das atividades pedagógicas que não conseguem ainda sanar esta explicita cisão entre os conteúdos programáticos das disciplinas e aqueles oriundos de problemas do cotidiano. A questão contemporânea da violência contra mulher servirá como elemento norteador para refletirmos o problema e lançar luzes para inovar nossas práticas visando superação dessa demanda pedagógica. Este artigo quer ser uma proposta instigadora de reflexão acerca do problema desta cisão e, para tanto, o caráter de cientificidade do mesmo repousará sobre algumas fontes documentais e literárias. Portanto, uma revisão bibliográfica.


PALAVRAS-CHAVE: Educação. Cultura. Transversal. Reflexão. Crítica.




1 INTRODUÇÃO

A sociedade atual apresenta-se como um palco onde se sucedem uma peça teatral após a outra. Esta metáfora, aponta para as mudanças culturais que ocorrem numa velocidade na qual a educação formal ou institucional não consegue acompanhar.
Globalização econômica e cultural, sociedade da informação, mudanças nas relações de trabalho, exigências de novas competências do trabalhador com as inovações tecnológicas, acesso em tempo real à informação nas mãos das pessoas, crise ambiental, crise política, crise bélica mundial, aprofundamento das desigualdades sociais, diversidades e o empoderamento de novos sujeitos contra as perspectivas tradicionais, são alguns dos aspectos destas mudanças.
Os profissionais da educação, porém, em grande parte, apresentam muitas dificuldades em compreender o seu papel mediador com seus alunados para refletirem estes aspectos que incidem diretamente sobre suas vidas.
Destas dificuldades, eu elencaria aqui dois objetos interessantes para nossa reflexão: os desafios frente às novas tecnologias e os problemas oriundos dos conflitos culturais. Fico com o segundo. Neste artigo ofereço uma breve reflexão sobre as dificuldades que há nas escolas quanto ao trabalho com conteúdos culturais de variadas matizes como, econômica, social, tradição, crenças religiosas, diversidade, e outros.



2 A RESISTÊNCIA AOS “TEMAS TRANSVERSAIS” NA ESCOLA

            Por tratarem de questões culturais, sociais e de diversidade, os Temas Transversais têm natureza diferente das áreas convencionais. Sua complexidade faz com que nenhuma das áreas da Ciência, isoladamente, seja suficiente para abordá-los. Ao contrário, a problemática dos Temas Transversais atravessa os diferentes campos do conhecimento. Por exemplo, a questão ambiental não é compreensível apenas a partir das contribuições da Geografia. Necessita de conhecimentos históricos, das Ciências Naturais, da Sociologia, da Demografia, da Economia, entre outros.
            Por outro lado, nas várias áreas do currículo escolar existem, implícita ou explicitamente, ensinamentos a respeito dos temas transversais, isto é, todas educam em relação a questões sociais por meio de suas concepções e dos valores que veiculam. No mesmo exemplo, ainda que a programação desenvolvida não se refira diretamente à questão ambiental e a escola não tenha nenhum trabalho nesse sentido, Geografia, História e Ciências Naturais sempre veiculam alguma concepção de ambiente e, nesse sentido, efetivam uma certa educação ambiental (BRASIL, 1997. p.29).
Diante desta problematização dos tema transversais recordamos uma crítica do professor espanhol Jurjo Torres Santomé (1995), feita à escola tradicional, que ainda se faz muito presente nos dias atuais. Tradicional no sentido que nossas escolas ainda estão muito presas a dar grande ênfase aos conteúdos apresentados em pacotes disciplinares, não conseguem que os alunos vejam esses conteúdos como parte do seu próprio mundo, em uma visão totalizante em conexões. 
A escola deveria potencializar os alunos a partir da capacidade de conectar, mobilizar, os conteúdos acadêmicos com os culturais, para que fossem capazes de intervirem socialmente em função de transformar o que precisa ser mudado nas suas realidades cotidianas (SANTOMÉ, 1995). Esta não apropriação reside no problema do modelo formativo de nossos atuais docentes:
[...] o professorado atual é fruto de modelos de socialização profissional que lhe exigiam unicamente prestar atenção à formulação de objetivos e metodologias, não considerando objeto de sua incumbência a seleção explícita dos conteúdos culturais. [...] Em muitas ocasiões os conteúdos são contemplados pelo alunado como fórmulas vazias, sem sequer a compreensão de seu sentido. Ao mesmo tempo, criou-se uma tradição na qual os conteúdos apresentados nos livros didáticos aparecem como os únicos possíveis. Como consequência, quando um professor se pergunta que outros conteúdos poderiam ser incorporados ao trabalho de sala de aula, encontra dificuldade para pensar em conteúdos diferentes dos tradicionais. (SANTOMÉ, 1995, p. 156-157)

Fica claro na crítica de Santomé (1995) uma realidade fordista da educação que não contempla o todo senão que apenas permite, no máximo, que se extraia dos alunos, após o processo ensino e aprendizagem, um saber que atenda apenas aos interesses da ordem social dominante. Portanto, um saber não problematizador, não crítico, não criador, não desestabilizador. Completamente o avesso do “homem rebelde e indócil” defendido por Freire (1981) como protagonista das transformações necessárias.
            Esta necessidade de conexão entre conteúdos disciplinares específicos com conteúdos culturais, reclamada por Santomé (1995) também está muito clara nas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica (BRASIL, 2013) como uma exigência para os docentes. Há neste documento um trecho em que é abordada a dimensão pedagógica da transversalidade. Parece que o texto confere à interdisciplinaridade um papel teórico, como visão de mundo, “uma compreensão interdisciplinar do conhecimento”, enquanto que a transversalidade seria a efetivação prática desse conceito:
A transversalidade orienta para a necessidade de se instituir, na prática educativa, uma analogia entre aprender conhecimentos teoricamente sistematizados (aprender sobre a realidade) e as questões da vida real (aprender na realidade e da realidade). Dentro de uma compreensão interdisciplinar do conhecimento, a transversalidade tem significado, sendo uma proposta didática que possibilita o tratamento dos conhecimentos escolares de forma integrada. Assim, nessa abordagem, a gestão do conhecimento parte do pressuposto de que os sujeitos são agentes da arte de problematizar e interrogar, e buscam procedimentos interdisciplinares capazes de acender a chama do diálogo entre diferentes sujeitos, ciências, saberes e temas. (BRASIL, 2013, p.27)

Na resolução CNE/CEB nº 7/2010 voltada para a educação básica fundamental temos uma compreensão mais ampla dessa relação entre educação e cultura como uma exigência intrínseca ao processo de ensino e aprendizagem. Dois trechos do documento nos são muito esclarecedores:
[...] Os conteúdos que compõem a base nacional comum e a parte diversificada têm origem nas disciplinas científicas, no desenvolvimento das linguagens, no mundo do trabalho, na cultura e na tecnologia, na produção artística, nas atividades desportivas e corporais, na área da saúde e ainda incorporam saberes como os que advêm das formas diversas de exercício da cidadania, dos movimentos sociais, da cultura escolar, da experiência docente, do cotidiano e dos alunos. [...] Como protagonistas das ações pedagógicas, caberá aos docentes equilibrar a ênfase no reconhecimento e valorização da experiência do aluno e da cultura local que contribui para construir identidades afirmativas, e a necessidade de lhes fornecer instrumentos mais complexos de análise da realidade que possibilitem o acesso a níveis universais de explicação dos fenômenos, propiciando-lhes os meios para transitar entre a sua e outras realidades e culturas e participar de diferentes esferas da vida social, econômica e política.  (BRASIL, 2010, p. 4 e 7).

Fica explícito nos textos acima que a escola se constitui em um espaço de poder. Alerta para o fato de que o conhecimento se dá por meio de processos que devem considerar as intersubjetividades envolvidas, a escola é o espaço por excelência para o diálogo intercultural. Como vimos até aqui o diálogo intercultural no espaço escolar deve valorizar a diversidade e priorizar a existência do outro como elemento de existência de si próprio.
Não se pode valorizar uma forma de vida, uma cultura ou um pensamento único. Neste caso, o respeito à dignidade humana, que exige o respeito cultural e o conhecimento mútuo, exige que resistamos à tentação de impor aos outros nossa cultura como modelo de convivência humana”.
O antropólogo e professor emérito da Universidade de Brasília, Laraia (2001), lembra que na atualidade, há um entendimento geral nos meios acadêmicos de que a cultura é um produto humano resultado de milênios, ou séculos, ou anos, de acúmulo de experiências compartilhadas por uma diversidade de grupos humanos interagindo entre si. Logo, se a cultura é compartilhada, é por meio de processos de aprendizagem. Portanto, se a cultura é produto humano, então é histórico-social o processo de sua constituição.
Para Laraia, a cultura é criação coletiva voltada para a comunidade e que ajuda na instrumentalização dos indivíduos para viverem em sociedade:

O modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos sociais e mesmo as posturas corporais são assim produto de uma herança cultural, ou seja, o resultado da operação de uma determinada cultura. [...] indivíduos de culturas diferentes podem ser facilmente identificados por uma série de características, tais como o modo de agir, vestir, caminhar, comer, sem mencionar a evidência das diferenças linguísticas, o fato da mais inédita observação empírica (LARAIA, 2001, p.68, grifo nosso).

            Nesta mesma perspectiva de Laraia, o pesquisador francês em etnologia e em antropologia Laplantine, compreende que é difícil conceber uma definição que seja absolutamente satisfatória para cultura. Laplantine (2003), também, por sua vez, tenta oferecer uma definição a partir da distinção entre o “social” e a “cultura”:
O social é a totalidade das relações (relações de produção, de exploração, de dominação...) que os grupos mantêm entre si dentro de um mesmo conjunto (etnia, região, nação...) e para com outros conjuntos, também hierarquizados. A cultura por sua vez não é nada mais que o próprio social, mas considerado dessa vez sob o ângulo dos caracteres distintivos que apresentam os comportamentos individuais dos membros desse grupo, bem como suas produções originais (artesanais, artísticas, religiosas...). [...] trata-se do social tal como pode ser apreendido através dos comportamentos particulares dos membros de uma determinada cultura, de pensar, de encontrar, trabalhar, se distrair, reagir frente aos acontecimentos (por exemplo, o nascimento, a doença, a morte).[...] a cultura é o conjunto dos comportamentos, saberes e saber-fazer característicos de um grupo humano ou de uma sociedade dada, sendo essas atividades adquiridas através de um processo de aprendizagem, e transmitidas ao conjunto de seus membros (LAPLANTINE, 2003, p. 95-96, grifo nosso).

Depreende-se destes referenciais que a cultura molda os costumes e em uma hierarquização que trabalha com os conceitos padrões de normalidade e anormalidade, estabelece o bem a ser promovido e o mal a ser evitado. A cultura é herdada e transmitida de pais para filhos a fim de organizar os comportamentos esperados dos homens em sociedade. A cultura tem o poder tanto de humanizar quanto de desumanizar. Ela é dinâmica e, por isso mesmo, passível de ser mudada, de ser transformada para melhor. Aqui entra o papel da educação: valorizar os aspectos positivos da cultura e eliminar tudo aquilo que na cultura se converte em ameaça às pessoas.
Mas para que estes objetivos sejam contemplados é necessário que a escola cumpra com sua função emancipatória de nossos alunos. Este conceito é claro pode nos remeter a vários autores, mas nem um como o pensador Paulo Freire foi fundamental para uma compreensão do mesmo dentro da realidade educacional brasileira.
Em sua obra fundamental, Pedagogia do Oprimido, de 1970, encontram-se os eixos centrais sob os quais são realizadas suas reflexões: a humanização é a vocação humana básica, apesar de que essa vocação é constantemente ameaçada por inúmeras formas sociais e culturais de opressão, que desumanizam as pessoas. Em relação a isso Freire (2003, p.30) alerta: “[...] Mas, enquanto a humanização e a desumanização são alternativas reais, só a primeira é a vocação do homem”.
O sentido da educação de acordo com Freire (2003) deve ser construído sob a base dos anseios por liberdade, por justiça, em busca de recuperar a humanidade roubada. Isso quer dizer que as pessoas são capazes de mudar sua realidade. Podemos tornar-nos criadores de nossa cultura, e não meras criaturas determinadas por ela. Podemos deter uma consciência crítica de nossa realidade a ponto de agir para mudá-la.
Uma outra ideia freireana (FREIRE, 2003) nos é muito salutar: a educação nunca é neutra, tem sempre consequências políticas. Essas consequências podem ser um moldar o sujeito de forma que se adapte no conformismo com a sociedade existente.
Resumindo a teoria educacional de Paulo Freire (2003) a educação deve ser um exercício de liberdade. Portanto, a educação não pode ser praticada por meio de um “método bancário”[1], mas sim de um método que considere a “resolução de problemas”. A conscientização, para Freire (2003), é um processo de decodificação da realidade, desnudando-a de tal forma que se chegue a conhecer os mitos que iludem e perpetuam a estrutura dominante de modo que as pessoas se disponham a mudar essa realidade no sentido da humanização.
A opressão, de acordo com Freire (2003, p. 65) “é um controle esmagador, é necrófila. Nutre-se do amor à morte e não do amor à vida.” Para escapar ao seu jugo, devemos emergir dela e voltar-nos contra ela. Isto só pode ser conseguido por meio da práxis: reflexão e ação sobre o mundo para transformá-lo.
Portanto, o papel do educador é estar com, em vez de estar acima das pessoas, capacitando-as a dar nome ao seu mundo e, através do diálogo, chegar a agir criativamente sobre a realidade histórica.
A metodologia freireana é a “resolução de problemas” num plano de totalidade. Quando somos capazes de uma educação da práxis em que teoria e prática encontram-se em uma relação dialética dependente, nos tornamos assim capazes de perceber que o problema X do qual nos ocupamos encontra-se em conexão com outros, e numa visão totalizante podemos então fazer a primeira superação que é a da alienação.       
É impossível pensar a educação sem refletir sobre o próprio homem. De acordo com Freire (1981) o homem enche de cultura os espaços geográficos e históricos. A cultura consiste em recriar e não repetir. A educação precisa ganhar um caráter de subversividade, pois não pode constituir-se em um mero meio de adaptação do homem à sociedade. A educação precisa ter a marca da criatividade, e a cultura idem.
Ora, neste ponto de nosso artigo querer refletir se a “violência contra a mulher” é ou não é conteúdo de domínio da disciplina de história, seria, usando uma expressão popular, “chover fora da horta”. Ficou claro que todo conteúdo cultural é e deve ser trabalhado em sala de aula em conexão com os conteúdos acadêmicos das diversas especificidades disciplinares.
Trabalhar os temas transversais em conexão aos acadêmicos por meio de práticas metodológicas interdisciplinares. Em trecho do documento do Ministério da Educação (MEC) (1997) podemos compreender melhor estas relações:
A interdisciplinaridade questiona a segmentação entre os diferentes campos de conhecimento produzida por uma abordagem que não leva em conta a inter-relação e a influência entre eles — questiona a visão compartimentada (disciplinar) da realidade sobre a qual a escola, tal como é conhecida, historicamente se constituiu. Refere-se, portanto, a uma relação entre disciplinas. A transversalidade diz respeito à possibilidade de se estabelecer, na prática educativa, uma relação entre aprender na realidade e da realidade de conhecimentos teoricamente sistematizados (aprender sobre a realidade) e as questões da vida real (aprender na realidade e da realidade) (BRASIL, 1997, p.31).
           
Não é difícil compreendermos que há dicotomias, lacunas, falhas didático-pedagógicas, epistemológicas, nas práticas docentes. Diante desta realidade urge que nossos docentes estejam preparados para os desafios contemporâneos que são postos para a educação na atualidade. Formação continuada, sem dúvidas, é a palavra-chave. É preciso que nossos docentes recebam formação adequada para que sejam capazes de abordar temas complexos como os exigidos pelos transversais.
É nesta perspectiva que Freire (1981) solicitava para o profissional da educação a exigência de que fosse capaz de um aperfeiçoamento epistemológico para além das especificidades de sua área de atuação. Reclamava a necessidade de uma incessante busca de ampliação de conhecimentos que pudessem abarcar o homem como um todo, para superar a visão ingênua da realidade, para não reproduzi-la simplesmente.
 [...] Na medida em que o compromisso não pode ser um ato passivo, mas práxis – ação e reflexão sobre a realidade – inserção nela, ele implica indubitavelmente um conhecimento da realidade. Se o compromisso só é válido quando está carregado de humanismo, este, por sua vez, só é consequente quando está fundado cientificamente. [...] está a exigência de seu constante aperfeiçoamento, de superação do especialismo, que não é o mesmo que especialidade. O profissional deve ir ampliando seus conhecimentos em torno do homem, de sua forma de estar no mundo, substituindo por uma visão crítica a visão ingênua da realidade, deformada pelos especialismos estreitos. (FREIRE, 1981, p. 21).

Os conteúdos culturais em conexão aos conhecimentos científico, filosófico e artístico, são essenciais para a elaboração da criticidade por parte do aluno. É a possibilidade de conceder sentido para o seu processo de aprendizagem. É a consciência de seu cotidiano marcado por contradições e desafios políticos. E é importante ressaltar que o estudo destes conteúdos devem estar claros quanto a uma abordagem que contemple a diversidade em seus múltiplos sentidos rechaçando qualquer sistema hierárquico de dominação cultural que se apresente, conforme podemos ler em orientações do MEC-Ministério da Educação:
[...] a inserção da diversidade nos currículos implica compreender as causas políticas, econômicas e sociais de fenômenos como etnocentrismo, racismo, sexismo, homofobia e xenofobia. Falar de diversidade e diferença implica posicionar-se contra processos de colonização e dominação. É perceber como, nesses contextos, algumas diferenças foram naturalizadas e inferiorizadas sendo, portanto, tratadas de forma desigual e discriminatória. (BRASIL, 2007)

A escola, portanto, tem a missão de abarcar a totalidade do conhecimento para dar conta do cotidiano, ou seja, a totalidade deve ser a marca desta educação emancipatória como podemos ler em documento da SEED/Paraná:
[...] A produção científica, as manifestações artísticas e o legado filosófico da humanidade, como dimensões para as diversas disciplinas do currículo, possibilitam um trabalho pedagógico que aponte na direção da totalidade do conhecimento e sua relação com o cotidiano. (PARANÁ, 2008, p.21.)

Isto que é vislumbrado em nossas diretrizes da disciplina de História (SEED/PR, 2008), mas em comum também nas diretrizes das demais disciplinas, é compreendido como uma exigência para os docentes no desenvolvimento de suas práticas pedagógicas. Quando tratam dos problemas contemporâneos e de diversidade a serem abordados em sala de aula, as Diretrizes da disciplina de História– texto comum às demais diretrizes, esclarecem que os problemas em questão devem receber “[...] um tratamento metodológico adequado, de forma contextualizada [...] sob o rigor de seus referenciais teórico-conceituais”. (PARANÁ, 2008, p.26).
O texto deixa claro que não devemos trabalhar os conteúdos de diversidade e contemporâneos em desconexão aos conteúdos específicos de nossas disciplinas curriculares. Ao contrário, devemos fazer a devida conexão no sentido mesmo que os conteúdos específicos de cada disciplina ganhem vida ao possibilitarem aos nossos alunados ampliarem a sua visão e compreensão do mundo complexo que os rodeiam e no qual estão inseridos, para nele poderem intervir.
A ideia central dessa reflexão é que o professor não pode isentar-se da sua missão de trabalhar conhecimento científico e conteúdo cultural em sala de aula. Não pode negar-se a trabalhar temas contemporâneos ou de diversidade que devem ser abordados no sentido de mitigar as violências reproduzidas na sociedade contra vários segmentos da população. Isto é dizer, em outras palavras: apenas o conhecimento poderá ser capaz de lançar uma luz de humanização sobre o homem em vias de desumanização. A educação tem um papel fundamental nessa tarefa.



3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quero finalizar este artigo mostrando o exemplo da urgência de um tema transversal ou problema contempor6ano que deveria ser tratado em sala de aula com a seriedade devida: a “violência contra mulher”.
Todos os dias, em média, treze mulheres são assassinadas no Brasil, a taxa de feminicídios é de 4,8 para cada conjunto de 100 mil mulheres – a quinta maior no mundo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), registrados no “Ätlas da Violência”. (CERQUEIRA et al., 2016).
            Os dados gerais do Atlas da Violência – 2016, demonstram que o Brasil é um país extremamente violento, com altas taxas de homicídios, que atingem mais homens, negros e pobres. Em uma sociedade com forte grau de valores machistas arraigados à cultura, o feminicídio ainda está longe de um enfrentamento eficaz: "[...] o debate em torno da violência contra a mulher por vezes fica invisibilizado diante dos ainda maiores números da violência letal entre homens, ou mesmo pela resistência em reconhecer este tema como um problema de política pública." (CERQUEIRA et al., 2016. p.29).
Na verdade, o feminicídio é apenas a forma mais letal da violência contra mulher. A violência de gênero ocorre em um ciclo vicioso que vai desde a violência moral, chegando à violência física por meio de estupros, agressões e, por fim, morte.
            No Atlas da violência de 2016, há uma conclusão pertinente a esta nossa reflexão: “[...] os dados [....] só reforçam a importância de políticas públicas focalizadas no combate à violência contra mulher. Trata-se de um fenômeno distinto da violência letal que atinge os jovens do sexo masculino [...]”. (CERQUEIRA et al., 2016. p.29).
            Apesar do “Atlas” reconhecer que as causas são culturais, quando analisamos as propostas de enfrentamento à violência contra mulher no “Atlas da Violência - 2016” (CERQUEIRA et al., 2016), percebemos que são mancas na medida que acabam identificando o fenômeno apenas como sendo de responsabilidade de instituições jurídicas, policiais ou de saúde. Podemos compreender as ações destas instituições muito mais como punitivas à violência já efetivada do que propriamente como ações preventivas com as quais não seriam necessárias as punitivas, ou com as quais poderíamos mitigar em grande parte o poder deste tipo de violência na sociedade.
            O próprio “Atlas da Violência” recorda que apesar das promulgações em 2006, da Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha (LMP), e no ano de 2015 da Lei 13.104, de 9 de Março, que torna o feminicídio crime hediondo e representa um marco político e histórico na luta pelos direitos das mulheres; não tivemos uma contenção considerável da violência contra a mulher. (CERQUEIRA et al., 2016. p.26).
            Obviamente esta nossa reflexão nos remete para ações preventivas que passem pela escola. Urge que o tema da violência contra mulher faça parte dos conteúdos dos processos de ensino e aprendizagem em todas as disciplinas da educação básica e superior.
            Violência contra mulher não é um tema de fácil domínio, é complexo. Este tipo de violência é desencadeado dentro de um conjunto de valores culturais que foram construídos ao longo da história e que uma vez hierarquizados cederam um lugar de inferioridade às mulheres na pirâmide social.
            Falar de violência contra mulher requer um conhecimento vasto de fenômenos culturais como machismo, racismo, etnocentrismo, lesbofobia, transfobia, de outras formas de desigualdades. Preconceitos, discriminações, conflitos oriundos da disputa por poder tanto nos âmbitos do privado quanto do público, são apenas ingredientes de um processo histórico-cultural que relegou um lugar de inferioridade às mulheres, conforme já constatava Simone de Beauvoir: "A mulher [...] permanecerá até os dias de hoje submetida à vontade do homem". (1970, p101).
            Para compreender essa violência, Beauvoir (1970) é muito feliz quando explica uma igualdade abstrata existente nas relações entre homem e mulher, que se choca com a desigualdade concreta entre os mesmos, quando diz que: “[...] ninguém é mais arrogante em relação às mulheres, mais agressivo ou desdenhoso do que o homem que duvida de sua virilidade.” (BEAUVOIR, p.20, 1970). Em seguida, ela conclui que o homem só considera a igualdade de gênero no que lhe convém, “[...] Mas, logo que entra em conflito com a mulher a situação se inverte: ele tematiza a desigualdade concreta e dela tira autoridade para negar a igualdade abstrata. [...].” (BEAUVOIR, p.20, 1970).
            Beauvoir (1970) considera que o ser feminino é o ser imerso no infinito drama de ser algo que ainda não se é: “[...] O drama da mulher é esse conflito entre a reivindicação fundamental de todo sujeito que se põe sempre como o essencial e as exigências de uma situação que a constitui como inessencial.” (BEAUVOIR, p.20, 1970).
            Ainda aproveitando as contribuições que a autora citada acima nos oferece, é importante destacar uma passagem de sua obra “O segundo sexo: Fatos e Mitos”, onde ela faz citações de Laforgue para destacar a importância de reconhecermos a mulher em sua individualidade de forma que ela não se perca em nossas ideias de igualdade de gênero: "'Ó moças, quando sereis nossos irmãos, nossos irmãos íntimos sem segunda intenção de exploração? Quando nos daremos o verdadeiro aperto de mãos? [...]. Então ela será plenamente um ser humano "[...] quando se quebrar a escravidão infinita da mulher, quando ela viver por ela e para ela [...]. (BEAUVOIR, p.307, 1970).
Já chamei a atenção para o fato de que a violência contra a mulher é um grave problema social que tem raízes profundas nos valores culturais de nossa sociedade. Os autores Martins, Angotti; Mafioletti (2009), compreendem a violência contra a mulher como um problema de saúde pública. Portanto, um fenômeno social.
Se é uma violência que deve mobilizar os meios policiais, jurídicos e de saúde pública, a questão central que nos interessa aqui neste artigo é saber em que medida o tema é relevante para abordagem nos processos ensino e aprendizagem desenvolvidos em nossas instituições educacionais. Pretende-se aqui justamente explorarmos quais poderiam ser as contribuições do ensino nas escolas para um enfrentamento da violência de gênero.
Martins; Angotti; Mafiolletti (2009), pontuam que:
“(...) violência contra a mulher requer uma abordagem múltipla que englobe aspectos históricos, sociais, jurídicos e médicos. A violência contra a mulher assume diferentes formas, exigindo assim uma análise cuidadosa que atente para as peculiaridades de cada uma: física, psicológica, patrimonial, sexual e moral. As vítimas são mulheres de todos os ciclos de vida, classes sociais, raças e etnias no Brasil e no mundo (...). (2009, p.99).

Corroborando com este entendimento das autoras, Freitas move esta abordagem da violência contra a mulher para o centro das atividades pedagógicas desenvolvidas em nossas escolas:
A escola, enquanto espaço social de convivência e de construção de significados éticos necessários e constitutivos de toda ação de cidadania, cabe ainda a tarefa de trabalhar a dimensão ética da formação dos alunos. Discussões sobre a dignidade do ser humano, a igualdade de direitos, a recusa categórica e o combate a todas as formas de discriminação, a importância da solidariedade e da observância às leis, são temas que ganham relevância no universo escolar o qual, até há bem pouco tempo, se preocupava muito mais com os conteúdos específicos de cada matéria escolar.  Portanto o papel da escola não é simplesmente o ensino do conhecimento cognitivo, mas também o lugar onde se ensina a ética, a cidadania e os conceitos de convivência social. É também um lugar onde o respeito e a boa educação devem ser constantes, tanto por partes dos educandos, como também, por parte de profissionais da educação. (FREITAS, 2014)

A violência contra a mulher ou violência de gênero, enquanto conteúdo escolar, se enquadra naquilo que encontramos em nossos documentos educacionais como sendo conteúdos transversais. O entendimento geral é o de que estes conteúdos que envolvem aspectos específicos sociais e culturais não podem ser esgotados pelo trabalho de uma única disciplina escolar, vez que exigem uma mobilização interdisciplinar.
Ressalvo o aspecto de que o tratamento a conteúdos culturais exige dos educadores conhecimento acerca dos mesmos, exige uma criticidade capaz de desconstruir “raízes” das violências que se apresentam como atentado aos direitos humanos, à dignidade da pessoa humana.
Desconstruir a violência contra mulher, por exemplo exige conhecer o lugar da mulher em nossa cultura e nas origens da mesma. A francesa Michele Perrot, foi a historiadora que colocou as mulheres em seu devido lugar na ciência recriadora da História. A mulher culturalmente sempre esteve à margem da vida em sociedade, não poderia ser diferente o seu lugar quando do registro da história pelos “historiadores”: Perrot lembra que: "Da História, muitas vezes a mulher é excluída." O “ofício do historiador" é um ofício de homens que escreve a história no masculino". (PERROT, 2006, p.185).
Perrot, e seu reconhecido trabalho de lançar luzes sobre as mulheres na história, é um excelente referencial de pesquisa para compreendermos os processos de lutas irrompidas pela organização de mulheres politizadas em todos os tempos da história, mas especialmente, a partir do século XIX.
Passado mais de um século desde que tivemos a instituição do dia 08 de março como sendo uma data no calendário reservada para uma reflexão sobre as relações de gênero e, especialmente, um momento oportuno para rever avanços e retrocessos na garantia dos direitos femininos, ainda temos uma sociedade organizada a partir de uma cultura hierarquizada que continua tratando a mulher como indivíduo em grau de inferioridade e subordinada ao gênero masculino.
Uma das bandeiras levantadas pelas mulheres no final do Século XIX e início do XX, a igualdade salarial, ainda se apresenta hoje como um problema na realidade brasileira quando mulheres recebem salários inferiores aos dos homens entre 30 e 40%. Este absurdo contemporâneo é apenas o “iceberg” de uma série de violências praticadas contra as mulheres.
Toda violência contra mulher, seja ela econômica, trabalhista, social, patrimonial, moral, psicológica, física, entre outras, podemos colocar na conta da cultura. Logo, a História enquanto disciplina tem muito a contribuir com a possibilidade de compreender a essência desta cultura machista simbolicamente de morte para as mulheres e repensar a desconstrução da mesma.
A condição da mulher Ocidental hoje está orientada de acordo com Perrot (2006), pela relação dos homens e mulheres com o “poder” ao longo da história. É o poder centralmente apresentado como masculino. Porém, das margens, da “periferia” do poder levanta-se a mulher para que por meio de um “poder” mais arejado, tenhamos a possibilidade de uma igualdade utópica de seu exercício. (PERROT, 2006, p.185).
Em suma, fica aqui, em aberto, o desafio que deve provocar em professores e professoras o esforço pedagógico, intelectual e humanizador, capaz de dar sentido aos estudos das nossas diversas disciplinas ao trazer os problemas contemporâneos ou transversais que considerem a cultura como objeto de estudo e reflexão.


REFERÊNCIAS

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 36.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: fatos e mitos. 4 ed. Trad. Sergio Milliet. Paris: Librairie Gallimard / Difusão Européia do Livro, 1970

CERQUEIRA, Daniel; FERREIRA, Helder; et al. Nota Técnica: Atlas da Violência 2016. N. 17. IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada)-  Brasília, março de 2016.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: apresentação dos temas transversais, ética / Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília : MEC/SEF, 1997. 146p.

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FREITAS, Sirley Leite. Violação dos direitos humanos no espaço escolar. Ouro Preto do Oeste/RO, UNEOURO, 2014. Disponível em: <http://faculdade.uneouro.edu.br/index.php/biblioteca/artigos/196-artigo-violacao-dos-direitos-humanos-no-espaco-escolar>. Acesso em: 21 Mar. 2017.

LAPLANTINE, François. Aprender antropologia. Trad. De Marie-Agnès Chauvel. São Paulo: Brasiliense, 2003.

LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 14. ed. Rio de janeiro: Jorge Zahar editor, 2001.

MARTINS, A. L.; ANGOTTI, B. e MAFIOLETTI, T. M. Violência contra a mulher: um problema de saúde pública. p. 99-108. In.: PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Caderno Temático de Sexualidade. Curitiba: Imprensa Oficial, 2009, 216 p.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes curriculares da rede pública de educação básica do Estado do Paraná: História. Curitiba: SEED, 2008.
PERROT, Michelle. Os excluídos da história: Operários, mulheres, prisioneiros. 4 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006.

SANTOMÉ, J.T. As culturas negadas e silenciadas no currículo.in: SILVA. T.T. (Org.). Alienígenas em sala de aula: uma introdução aos estudos culturais em educação. Petrópolis: Vozes, 1995.



[1] Freire entendia o “método bancário” como a prática pedagógica baseada no depósito de informações em receptáculos passivos. Há uma cisão na relação intersubjetiva entre educador e educandos. O primeiro atua como profissional do “depósito” de conhecimentos abstratos que o sistema entende serem necessários dos estudantes possuírem para adequarem-se à realidade social.

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SUGESTÃO DE LEITURA E DE LIVRO (pdf) PARA BAIXAR GRÁTIS: Segundo Sexo é um livro escrito por Simone de Beauvoir, publicado em 1949 e uma das obras mais celebradas e importantes para o movimento feminista. O pensamento de Beauvoir analisa a situação da mulher na sociedade. No Brasil, foi publicado em dois volumes. “Fatos e mitos” é o volume 1, e faz uma reflexão sobre mitos e fatos que condicionam a situação da mulher na sociedade. “A experiência vivida” é o volume 2, e analisa a condição feminina nas esferas sexual, psicológica, social e política. 
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Publicação original:https://cpalexandria.wordpress.com/